Leituras poéticas – Capítulo 59

 


O Húmus do jardim

África

 

Por Majda Hamad Pereira

 

O mundo continua comendo

Eles continuam morrendo

 

O mundo continua comendo

Eles continuam morrendo

Morrendo eles continuam

Comendo continua o mundo

Eles morrendo continuam

Continua o mundo comendo.

 

Reflexão – Uma leitura possível do poema:

 

África

 

O poema 'África', de Majda Hamad Pereira, apresenta uma denúncia veemente da desigualdade mundial, com foco especial na situação do continente africano. Por meio de uma estrutura simples e impactante, a autora expõe de forma crua a contradição entre a opulência de alguns e a miséria de outros.

 

Estrutura e Linguagem

 

repetição das frases 'O mundo continua comendo' e 'Eles continuam morrendo' desempenha um papel fundamental na construção do sentido do poema. A repetição confere à obra um caráter ritualístico, aproximando-a da tradição oral e reforçando a dimensão performativa da linguagem poética. Essa repetição enfatiza a natureza cíclica e injusta da desigualdade, sugerindo que a situação se mantém imutável, apesar da consciência global do problema.

 

concisão, característica marcante do poema, elimina qualquer tipo de ornamentação ou adjetivação desnecessária, focando exclusivamente na denúncia da desigualdade social. Essa escolha estilística intensifica o impacto emocional do poema, direcionando a atenção do leitor para o contraste brutal entre a opulência de alguns e a miséria de outros.

 

A escolha pela linguagem simples reflete uma opção estética que busca democratizar o acesso à poesia, tornando-a um instrumento de denúncia e de conscientização social. A utilização de um vocabulário cotidiano e de frases curtas e diretas contribui para a clareza e a objetividade da mensagem, tornando-a mais impactante e memorável.

 

inversão da ordem das palavras, como em 'Morrendo eles continuam', destaca a perversidade da situação, sublinhando a anormalidade de um mundo em que a morte se sobrepõe à vida e a fome à fartura. Essa inversão, ao lado da repetição e da concisão, contribui para a construção de um efeito de estranhamento que intensifica o impacto emocional do poema.

 

Leituras...

 

denúncia da desigualdade presente no poema se insere em um contexto histórico marcado pela intensificação das desigualdades globais, resultante da globalização e da neocolonização. A imagem do 'mundo comendo' enquanto 'eles' morrem revela a exploração e a injustiça que sustentam o sistema capitalista, no qual a riqueza de poucos se baseia na miséria de muitos.

 

crítica ao consumismo presente no poema nos convida a refletir sobre o impacto de nossas escolhas de consumo na vida de outras pessoas e no planeta. A imagem do 'mundo comendo' enquanto 'eles' morrem denuncia o consumismo excessivo e desmedido dos países desenvolvidos, que contribui para a escassez de recursos e para a intensificação das desigualdades sociais e ambientais.

 

O poema nos convida a assumir uma postura ética diante da desigualdade, questionando nossas próprias ações e buscando formas de contribuir para a transformação da realidade. A repetição da mensagem, ao criar um efeito de insistência, intensifica o apelo à consciência e nos convida a refletir sobre o nosso papel nesse cenário de injustiça.

 

A repetição insistente da morte e da fome, aliada à concisão das frases e à ausência de qualquer perspectiva de mudança, culmina na criação de uma atmosfera de desespero e impotência que invade o leitor. Essa sensação de impotência frente à injustiça e à desigualdade ecoa a angústia do ser humano diante da finitude, revelando a fragilidade da condição humana frente às forças sociais e históricas.

 

Por fim

 

O poema 'África' é uma denúncia veemente da desigualdade mundial, construída através de uma linguagem simples e direta, mas de grande força expressiva. A repetição, a concisão e a inversão sintática são recursos estilísticos que contribuem para a criação de uma imagem impactante e memorável. Ao denunciar a injustiça e ao apelar para a solidariedade global, o poema convida o leitor a se engajar em ações concretas para transformar a realidade e construir um futuro mais justo e equitativo.

 

Poeta Hiran de Melo


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